novembro 29, 2007

Metáfora

"Dão-nos uma cama de casal e depois só temos roupa de solteiro".
Ouvi, por estes dias, esta frase a alguém para descrever a realidade das escolas.
E aplica-se somente às nossas escolas?

novembro 19, 2007

Miguel Torga - Retrato

O meu perfil é duro como o perfil do mundo.
Quem adivinha nele a graça da poesia?
Pedra talhada a pico e sofrimento,
É um muro hostil à volta do pomar.
Lá dentro há frutos, há frescura, há quanto
Faz um poema doce e desejado:
Mas quem passa na rua
Nem sequer sonha que do outro lado
A paisagem da vida continua.

Escravidão do conhecimento

Em entrevista à "Pública", de 18 de Novembro de 2007, António Bracinha Vieira fala sobre o modo como nos tornámos escravos do incaracterístico, ou seja, mergulhados no fluxo da mercadoria, vivendo para consumir e agindo na base do individualismo.
Hoje em dia elimina-se tudo o que é complexo e defende-se a desvalorização do conhecimento no sentido mais humanista, privilegiando-se o conhecimento-mercadoria e, consequentemente, as ciências "que vão reforçar a indústria e aumentar os lucros das grandes sociedades".
E fala ainda:
"Para já, o apagar do Grego ou do Latim, da Filosofia e das Humanidades surgiu na lei, não estou a inventar esses factos, os governos começaram a decidir que não se ensinava isso nos liceus ou só em certos cursos. Os cursos de Filosofia e Humanidades estão a fechar porque não têm alunos, e porquê? Porque o dinheiro é o objectivo. Quem tem interesse em estudar Literatura quando isso não lhe resolve o problema da vida? É inútil em termos pecuniários".
E nesta voragem economicista do conhecimento, poderemos argumentar, há muitas outras áreas que não fazem parte de uma sociedade da informação e conhecimento, acentuando-se cada vez mais a tendência para a escola e universidade enveredarem por cursos predominantemente profissionalizantes.

novembro 14, 2007

No interior da escola...

Voltei a sentar-me nos bancos da escola primária, agora baptizada com o nome de 1º ciclo do ensino básico. Por mais pequeninas que sejam as cadeiras, consegui ficar à altura dos alunos e falar com eles sobre a escola que têm e sobre as actividades que realizam.
Sentem-se muito bem na escola e gostam desse seu mundo feito de exigências, de brincadeiras e de tudo o mais que as traquinices poderão deixar antever.
A sala de aula dos pequenotes é uma outra realidade: fichas de apoio, imagens, desenhos, mapas, jogos computadores, Internet ... sei lá o que mais dizer sobre as imensas e interessantes actividades que são usadas como recursos da aprendizagem.
Mas os pais querem mais: não gostam de uma escola isolada, pretendem que os seus educandos tenham todas as condições pedagógicas e exigem melhores instalações. Não acreditam jamais na escola de um professor, na sala da escrita e dos números, pois sentem que os tempos são outros e que o mundo deixou de caber num só manual.
Por mais estranho que pareça, os pais não estão presos à terriola da escola e lutam pelos centros escolares do 1º ciclo.
Lembrei-me, neste quadro, da situação de Paredes de Coura, um dos concelhos que promoveram com sucesso a concentração de escolas do 1º ciclo do ensino básico. Recordemos-nos dos medos iniciais e, sobretudo, da politização do caso. Seria a hora de balanços e, mais ainda, de admitir como é que os partidos são movidos mais por interesses meramente pessoais do que por ideias com futuro.
Mas os partidos políticos não gostam, nunca, dos seus passados, pois existem em função da promessa, a concretizar no futuro.

novembro 03, 2007

Ranking de quê?

Com base nos resultados dos exames nacionais (do 9º e 12º anos de escolaridade), os meios de comunicação social têm apresentado a lista seriadas de escolas (rankings). Trata-se de uma mera listagem de resultados e tudo o resto se pode inferir, como o têm feito muitos "opinions makers", sobre o modo de ser das escolas públicas e privadas.
Aceitando-se que são subsistemas diferentes, essencialmente marcados pela lógica do serviço público e pela lógica de mercado, respectivamente, aceitando-se que o currículo nacional é o mesmo, aceitando-se ainda que os professores têm idêntica formação, por que razão se insiste em comparar o que é obviamente diferente?
A diferença está nos alunos e seus contextos. Faça-se a experiência: mudem-se os alunos da primeira e última escolas, mudem-se os seus contextos e depois avaliem-se os resultados.
A mais-valia de uma escola privada está no seu poder de captar alunos e de seleccioná-los.
A pergunta incómoda: quantos alunos de escolas públicas podem frequentar as escolas privadas que os rankings colocam nos primeiros lugares?