junho 22, 2011

Chumbar duas vezes só com autorização dos pais

domingo, 19-06-2011
Diário Notícias, ANA BELA FERREIRA



Chumbar duas vezes só com autorização dos pais do ensino Básico. Para reter um aluno mais do que uma vez no mesmo ciclo, encarregados de educação têm de autorizar. Professores dizem que regras servem apenas para mascarar resultados
Dificultar os chumbos para fabricar o sucesso. Para os professores, este é objectivo das várias condições que têm de ser cumpridas para se poder reprovar um aluno no básico. Planos de recuperação, justificações escritas e uma legislação que determina claramente que a retenção "só ocorre após a aplicação de uma avaliação extraordinária" são alguns dos pressupostos que têm de ser cumpridos. E, para chumbar um aluno duas vezes no mesmo ciclo de ensino, a escola tem de contar com o aval dos encarregados de educação. "Caso o encarregado de educação não autorize, a escola terá dificuldade em chumbar o aluno", alerta José Augusto Pacheco director do Centro de Investigação em Educação da Universidade do Minho. E os pais fazem questão de usar esta protecção da lei. No ano passado só a CNIPE (Confederação Nacional Independente de Pais e Encarregados de Educação) ajudou cerca de 12 pais do ensino básico a contestar as notas dos filhos, exigindo uma classificação mais alta, o que em alguns casos se traduzia na passagem de ano da criança. "Em alguns casos ajudámos a contestar o primeiro chumbo e noutros era já o segundo", explica Maria José Viseu, da CNIPE. Mas a experiência de Ricardo Silva é contrária a esta realidade. "Sou professor do 3.° ciclo há muitos anos, já fui director de turma e nunca tive um pai que contestasse a opinião dos professores em relação aos resultados escolares do filho." Até porque, acrescenta o dirigente da APEDE (Associação de Professores e Educadores em Defesa do Ensino),"normalmente os pais mostram-se perplexos e nem sabem o que escrever" no parecer que têm de dar, quando a segunda retenção dos estudantes no mesmo ciclo é ponderada. A autorização dos pais pode não ter um carácter vinculativo, mas José Augusto Pacheco não tem dúvidas de que é uma forma de dificultar os chumbos. "Tudo isto torna algo difícil concretizar uma retenção", diz. Uma coisa é certa, cada vez reprovam menos alunos e, apesar de o Ministério da Educação não revelar os dados do ano lectivo passado, em 2008/ /2009 só ficaram retidos 13% no básico. Ou seja, 159 215 estudantes num total de 1215380 do l.°ao 9.° ano.

A indicação de que os pais têm de ser consultados sobre os chumbos está fixada no despacho normativo 1/2005. O número 65 refere que "na tomada de decisão acerca de uma segunda retenção no mesmo ciclo, à excepção do 9.° ano, deve ser envolvido o conselho de docentes ou o conselho pedagógico e ouvido o encarregado de educação do aluno".

Os pais são informados no segundo período de que o filho está em risco de reprovar. Por esta altura, os pais são informados e implementam-se os planos de recuperação. Um conjunto de procedimentos estipulados legalmente que revelam, segundo Ricardo Silva, "uma desconfiança em relação ao trabalho dos professores. Como se eles não fizessem toda a vida planos de recuperação quando os seus alunos estão em dificuldades". De facto, as imposições legais até trazem constrangimentos. "Tanto quiseram salvaguardar o direito do aluno ao plano de recuperação que limitaram a sua aplicação a Março. Se um aluno ficar em risco após essa data, já não pode ter ajuda extra de forma oficial". A obrigatoriedade de ouvir os pais é importante, defendem os seus representantes. "Os encarregados de educação devem ser escutados e responsabilizados pelos filhos", diz Maria José Viseu. Mas revelam preocupações. "A dúvida é que os pais tenham formação para acompanhar os filhos nessa recuperação", alerta Albino Almeida, da Confederação de Pais.

Mudar de sistema ou levar mais a sério os apoios

AVALIAÇÃO Não concordando com o método actual, professores e pais pedem mudanças no sistema de avaliação dos estudantes. Albino Almeida, da Confederação de Pais, considera é que é preciso aplicar um método diferente. "Todos os alunos merecem uma segunda oportunidade. Por isso, defendemos o sistema de créditos. Os alunos não chumbam, apenas têm de juntar créditos suficientes para passar de ano. Se não conseguirem, trabalham no Verão para atingir esse objectivo", aponta. O professor Ramiro Marques defende que os apoios tutoriais devem ser levados mais a sério, já que neste momento apenas "se fazem um conjunto de justificações para poder chumbar um aluno, que só acrescentam burocracia". Assim, "o importante seria dar apoios tutoriais sérios nas disciplinas em que o aluno tem mais dificuldades e colocar os professores mais experientes nesse apoio. É assim que se faz na Finlândia". Também o coordenador nacional do Projecto Escolas Rurais e director executivo do Instituto das Comunidades Educativas, Rui d'Espiney, aponta para o impacto negativo das restrições aos chumbos, que têm por base "a imposição de resultados". "Se for necessário, neste momento, até com um chicote se impõem medidas para garantir que os resultados são alcançados". Uma ideia antieducativa, garante o professor. A sua experiência diz-lhe que o caminho está numa maior interacção entre a escola e a família. "Não se tem investido num diálogo para a construção de um projecto educativo. Se isso acontecesse ia aumentar o sucesso escolar", assegura. A.B.F.

junho 06, 2011

Bem-vindos os "troikianos"

Terminada a campanha eleitoral, depois de tantos meses de incertezas e de tantas palavras mil vezes ditas, terminada, ainda, a utopia das promessas eleitorais, chegou a hora da verdade.
Não interessa o vencedor.
Já se sabia que a mudança teria de acontecer, mais cedo ou mais tarde, pois quem tem o desgaste das decisões impopulares já conhece o seu destino político, embora esta derrota pudesse ter sido evitada, caso tivesse existido esclarecimento por parte de certos dirigentes nacionais, que sempre teimam em não reconhecer a realidade em que vivem.
Terminou, por isso, o tempo dos políticos, pelo menos, por três a quatro anos.
Começa, agora, o tempo dos técnicos especialistas em economia.
São os “troikianos” que passam a governar Portugal.
Os partidos vencedores apenas servem para escolher as pessoas que vão executar o que é imperioso fazer, alimentando assessorias, cargos e mais cargos, numa roda-viva de mudança no interior dos ministérios.
Até tantos de tantos reduz-se a taxa das empresas para a segurança social, até finais daquele mês e daquele ano sobem-se os impostos, privatiza-se o que é público e aumenta-se o que o simples cidadão tem de pagar pelos serviços públicos.
Depois, reduzem-se as freguesias e os concelhos, manda-se para o desemprego funcionários autárquicos e reduz-se o orçamento das autarquias em 15%.
A mudança parece que começa, desta vez, de baixo para cima, já que não é expectável que o Estado reduza o seu despesismo nas mordomias, mesmo que o governo venha a ter menos ministros, pois aumentarão, decerto, as secretarias governamentais.
O Estado gasta em excesso consigo próprio, tornando-se incompetente no momento em que o faz.
Só que a redução dos concelhos e das freguesias, a realizar até Julho de 2012, com aplicação nas próximas eleições, em 2013, desencadeará mais polémica e permitirá o confronto entre territórios desavindos, sendo raros os casos em que a mudança acontece por consenso.
E neste caso, os “troikianos”, os nossos verdadeiros governantes, que nos visitarão de três em três meses, durante três anos, vão presenciar lutas que jamais imaginaram, assistindo, na sua função de técnicos, a uma questão que mexe com tradições e emoções.
Sim, pertencer a um território é uma questão emocional, que sempre transportamos connosco, tornando-se difícil neste campo tomar decisões meramente técnicas.
Mas sobre isso, os políticos, na campanha eleitoral, nada disseram, calaram-se, não abriram a boca e comportaram-se como se nada fosse com eles.
E não é difícil de adivinhar quem mais sofrerá as consequências. E a questão inverte-se: os que ganham hoje são os que perdem amanhã, pois é este o verdadeiro jogo da democracia.