novembro 26, 2012

novembro 25, 2012

 Jornal "O Público" de 25 de novembro de 2012:

"... Desconcertante, é como José Pacheco, da Universidade do Minho, classifica o modo como este debate [ensino dual] foi lançado pelo Governo: não existe um documento, um projeto, nada que defina de forma sustentada e que posssamos analisar. Isto não é normal".

novembro 21, 2012


É, por certo, o governo mais desacreditado de todos os tempos, desde o constitucionalismo liberal até aos governos republicanos, é, sem qualquer dúvida, o presidente mais calado do regime democrático, é, sem qualquer medo de dizê-lo, o ministro mais inadequado de todos os governos, é, como todos reconhecem, o momento mais crítico para o poder local, para não falar no estado caótico e desordenado das finanças públicas.

É com estes sujeitos políticos e é neste contexto que, em nome de uma chamada unidade técnica para a reorganização administrativa do território, o município de Paredes de Coura, como em tantos outros, é confrontado com uma “proposta concreta” de agregação de freguesias.

Na ausência de pronúncia, a referida comissão, mandatada pela assembleia da república, decidiu, a regra e esquadro, o que os eleitos locais não decidiram, pois não só discordaram, por unanimidade, da lei imposta de cima para baixo, bem como contestaram a aplicação desgarrada de outras leis, por exemplo, a das finanças locais e a da eleição do poder local.

Eles, os do terreiro do paço, decidiram pelos outros, os do poder local. Esta é a triste realidade da política portuguesa. E decidiram sem legitimidade, dado que a criação e extinção de freguesias é uma das competências do poder local, não podendo ser realizada por um governo democraticamente desacreditado que ignora os princípios políticos do poder local.
Decidir como quer decidir a assembleia da república, escudada por uma comissão técnica, de natureza administrativa, é uma ameaça séria ao poder local e ao seu contexto histórico, construído há séculos pelo municipalismo.
A proposta apresentada, que terá de ser validada pelos deputados da maioria, é surrealista, sobretudo no modo como se arroga na pretensão de interpretar a lei, juntando de forma quase arbitrária as freguesias.
Caíram nesta malha politicamente estúpida as freguesias de Porreiras, Insalde, Paredes de Coura, Resende, Bico, Cristelo, Cossourado, Linhares, Formariz e Ferreira. “A união das freguesias de…” é a designação que se pretende para o futuro.
Porém, e os decisores não leram, ou não quiseram ler, que as todas as assembleias de freguesia do município e a assembleia municipal rejeitaram, por unanimidade, a implementação da referida lei.
Quer dizer, assim, que temos um governo central que é surdo para com o poder local, sendo, de igual modo, mudo no modo como dialoga, “protegido pela maioria”, com esse mesmo poder local.
E esta posição é politicamente insustentável e democraticamente inaceitável.

novembro 07, 2012


Regressei a Cabo Verde. Por uns dias, mas que se vão transformando em semanas.

Está-se bem pela Praia, uma cidade que foi crescendo ao ritmo da maturidade democrática no período pós-independência (sendo de considerar 1975, de Portugal, e 1980, da Guiné) onde se respira uma transição de culturas e por onde se entra numa porta especial da africanidade.

Entretanto, escrevo estas palavras do Mindelo, na ilha de S. Vicente, um lugar especial, a terra de Cesária Évora, que agora tem o seu nome estampado no aeroporto, e merecidamente. Disseram-me, aqui, que o seu funeral foi uma das manifestações populares mais memoráveis de todos os tempos.

É fim de tarde e do meu poiso de escriba errante, observo o monte cara, de uma figura de corpo deitado, dormindo em silêncio o sono profundo do tempo, e iluminado pelos raios enfraquecidos de um pôr do sol que brinca com as nuvens escuras que abraçam a ilha de Santo Antão.

Este fim de tarde coloca-me num outro lugar. Em Díli, na praia branca. O que hoje ouvi, numa conferência de um académico cabo-verdiano, trouxe-me de volta Timor.

Da última vez que por lá andei, frequentei, na referida praia, com um sol vermelho mergulhando no mar de ondas douradas, o restaurante chamado morabeza.

E esse académico falou precisamente sobre a identidade singular dos cabo-verdianos, que definiu como sendo um processo histórico de encontrão, ou seja, de adaptação constante a uma nova realidade, de enorme dureza e cheia de dificuldades climatéricas, geográficas e económicas. Pela sua natureza histórica, o povo cabo-verdiano é uma síntese do quase impossível: o de querer estar naquilo que é a insularidade e o de querer partir para outros mundos, como se estivesse em permanente viagem.

Tal identidade, que é plural e se alimenta da diáspora, tem uma palavra que é central na sua construção: morabeza.

Agora compreendo por que razão o tal restaurante, em Díli, pertence a um cabo-verdiano e de que modo morabeza tem um sentido diferente do que a palavra saudade.

 É uma saudade de contentamento, não de tristeza e de melancolia e de solidão interior.  Não se volta para o interior do sujeito, mas para o seu exterior, sendo algo que se cultiva na lógica de uma pertença a um espaço, que deixou de existir e que apenas é feito de memórias e tradições. Morabeza é o pensar positivo de um destino, é uma palavra viajante, sem destino algum, alimentando-se dos dias que passam e que se consomem no tempo. Morabeza é o que se recorda com alegria e com satisfação, sem pressentimentos negativos e acreditando num futuro que ainda é possível. Por isso, esta palavra é tão utilizada na caraterização da identidade dos cabo-verdianos, já que nas veias não lhe corre o sangue da tristeza mas, pelo contrário, a musicalidade africana.  

Bem, preciso de terminar esta crónica, pois espera-me o regresso à cidade da Praia levando na mochila que transporto um bocadinho de morabeza, pois do Mindelo há imagens que ficam para sempre e das quais nos vamos tentando recordar. E uma imagem que levo comigo é a da noite das “bruxinhas”, vestidas eroticamente de preto, inundando uma das baías mais bonitas que já conheci.

Sim, Mindelo é especial. É morabeza.