março 04, 2013


Saí de Tóquio em direção a Singapura e ainda fui a tempo de presenciar comemorações do novo ano chinês, em que o bairro de Village se encheu de barracas de comes e bebes, trazendo-me à memória o que acontece em Coura todos os anos, quando o largo da feira se enche de comida tradicional e se empanturra de vinho e cerveja.
Mesmo sendo um ponto de passagem, pois é um dos maiores centros distribuidores do mundo ao nível de passageiros aéreos e de contentores comerciais, Singapura tem uma beleza urbana que jamais se pode esquecer. É principesca nos seus edifícios e exibe os sinais de uma das sociedades mais organizadas que poderemos conhecer, apesar de ser uma democracia imperfeita, lembrando a frase que se utiliza para os tempos gregos de Péricles e companhia.          
E chego a Timor, mais concretamente a Díli, levando na bagagem a expetativa de saber como iria reencontrar a cidade depois da saída da quase maioria do pessoal da ONU e também do contingente da GNR. E Díli mudou imenso. Há menos circulação de carros oficiais, ou de jipes superprotegidos de pessoas bem pagas internacionalmente, continuando mesmo assim o trânsito frenético de motas e de táxis.
Desta vez, circulei muito pouco dentro da ilha. Apenas fui a Liquiçá e Maubara, numa visita rápida, pois as estradas, como diz o Snr. Félix – um dos homens mais simples de Timor e um dos mais teóricos da sabedoria popular -., estão cada vez mais preguiçosas, ou seja, com muitos obstáculos que as tornam lentas e quase imprevisíveis.
Depois da forte de Maubara, chamou-me a atenção um conjunto de campas brancas, moídas de sujidade pelo tempo. Aproximei-me e, amarguradamente, contei, na primeira fila, 12, e na 2ª fila, cinco. Li, em voz alta, os seus nomes, todos eles escritos em língua portuguesa, e confirmei a data da sua morte, a 6 e 17 de abril de 1999. Todos jovens, entre os 14 e 22 anos. Que dor de alma esta imagem de incompreensão humana, sobretudo quando se está perante alguém que lutou para ser livre, acreditando no entendimento entre as pessoas. Mais uma vez, socorri-me do conhecimento do Snr. Félix, que me informou que se tratou de dois massacres. Fico sem palavras e um arrepio percorre-me o corpo, impondo-me o máximo de respeito por estes jovens, cobardemente assassinados.
Torno a ler os seus nomes, agora, no meu silêncio de sofrimento, e fico distraidamente a olhar para as águas azuis de um mar calmo que se prolongava à minha frente.
Gostaria de ter ficado assim mais tempo, mas tive de voltar a Díli, já que as estradas estavam inundadas de uma chuva copiosa que caíra sem parar durante algumas horas.