outubro 23, 2012


Se tivesse de mudar alguma coisa no espaço de uma crónica quotidiana, que vou escrevinhando em cada publicação do jornal Notícias de Coura, acrescentaria ao texto uma fotografia. Nos últimos anos, tudo se revolucionou no campo da fotografia digital, desde as máquinas até à impressão, com ganhos evidentes para a sustentabilidade do planeta. Fotografa-se mais, é certo, há uma realidade mais documentada, também é verdade, mas banalizámos o momento especial de ficar em memória.
Sobre algum evento tira-se foto e mais foto e depois deixamo-las ficar adormecidas no disco duro de um computador, como se tivessem entrado em hibernação prolongada. Um dia já não existirá software para as reproduzir e nesse caso lá se vai a memória breve, como aconteceu às imagens gravadas em vídeo VHS, para falar no sistema mais utilizado.
Quanto ao que está a acontecer-nos em termos de fotografia, nesta instantaneidade de registos crescentemente desvalorizados, poder-se-á escrever muitíssimo, como por exemplo, um ensaio para uma futura filosofia da fotografia, um livro que comprei há anos e que ainda não tive a oportunidade de ler.
Falo em fotografias porque um amigo meu de Coura mandou-me, hoje mesmo, uma dos meus anos de bombeiro voluntário. Por tempos, no único ano que estive por inteiro em terras courenses, depois dos meus 13 anos, e antes de voltar a partir, aos 19 anos, dediquei-me à causa do voluntariado.
Fiz a instrução no quartel contíguo ao edifício da câmara municipal, e participei nos poucos incêndios que nessa altura deflagravam, pois as florestas estavam limpas e a criminalidade não imperava.
Num dia de aniversário, os bombeiros voluntários foram convidados para um almoço numa dos restaurantes de Coura, na rua principal. Recordo-me bem desse dia, mas lá está a fotografia, que me foi enviada, a preto e branco a relembrá-lo.
De um lado, estão os mais velhos, os respeitáveis sócios e veneráveis diretores, do outro, os jovens bombeiros, de cabelos longos e sorrisos abertos.
Reconheço-os a quase todos, pois foram-me familiares, sendo mais fácil para os mais jovens que comigo tiraram a recruta de voluntário, aprendendo a marchar, a subir e descer escadas, a manusear mangueiras de incêndio e tudo o mais que fazia da vida de um bombeiro um tempo de solidariedade. E um espaço de convívio.
Desse ano especial para mim, há esta fotografia que retrata uma realidade de muitos jovens courenses que, como eu, decidiram voluntariar-se em nome da ajuda aos outros.
Nunca mais tive tempo para ser bombeiro e a minha relação foi acabando, mantendo-me como sócio e como participante numa ou noutra cerimónia, como o da mais recente, em que a associação humanitária de Paredes de Coura se tornou centenária, decerto, retratada a cores e em mil uma fotografias.
Mas esta foto a preto e branco é especial e, deste modo, quero agradecer ao bom amigo que amavelmente a enviou por email.