Dormir é algo de bom, mas se o sono da primeira noite, aturdido pelos motores incansáveis de doze horas de viagem aérea, de Istambul para Bali, não pegou, já o da segunda, no apressado quarto de um hotel, quase dentro do aeroporto, serviu para relembrar que o cansaço é um obsessivo empecilho à tranquilidade de um bom sono. Não dormi, claro! São seis horas da madrugada, e o pequeno almoço ainda está a ser preparado por movimentados rapazes, vestidos de preto.
Aguardo, por isso, de
olhos pesados, o voo para Timor-Leste. Os cantos da sala do pequeno almoço
compõem um hino à diversidade de produtos e sua diferença para hábitos
europeus.
Porém, para quem tem
ainda uma viagem de avião, o experimentar novos sabores pode não ser o mais aconselhável,
limitando-me, assim, ao básico de um pequeno almoço português, acrescido de
fruta e queijos.
Deixei o hotel e
desemboquei diretamente na área internacional do aeroporto, na área do “Check-in”,
reservada aos que têm voo, uma particularidade comum a muitos aeroportos
asiáticos.
Obtido o bilhete,
apenas disponível no modo presencial, passei pelo controlo da emigração, usando
as máquinas eletrónicas, como deveria acontecer em todos os aeroportos,
sobretudo nos de Lisboa e Porto, onde são de uma ineficiência gritante.
E aqui estou sentado,
relaxado, sonolento, no “Bali Sky Café”, saboreando o meu primeiro café do dia.
Tive ainda tempo para rever a introdução que escrevi no voo Porto-Istambul,
usando os sensíveis caracteres do telemóvel, para um livro cuja publicação se
avizinha, bem como para terminar um artigo de opinião, a caminho do estilo de
ensaio, para enviar para o jornal PÚBLICO, e longamente observei o acordar
aeroportuário, de mil e uma peças que constituem a sua engrenagem, na qual não
pode entrar um grão de areia, senão vira caos e gera tensões.
Já sentado na
primeira fila, porque sempre peço que seja o mais à frente possível, e também
corredor, da aeronave com destino a Díli, aguardo a descolagem, que acontece no
horário previsto, precisamente às nove e trinta da manhã, de um sábado, cheio
de sol e com nuvens esparsas, sob o olhar atento – e protetor para os crentes –
da divindade hindu Garuda Wisnu Kencana,
cuja estátua domina esta pequena ilha do extenso arquipélago indonésio.
Dormitei coisinhas de
tempo disperso, o suficiente para abrir os olhos um pouco antes de aterrar no
aeroporto Nicolau Lobato. A sensação de estar em Timor-Leste é inenarrável,
qual dança de intensas emoções!
Nesta plêiade de sentimentos, destaca-se o primeiro olhar, que num instante tudo absorve e interioriza, como se não precisássemos de mais nada. Agora, compreendo melhor a felicidade que há anos registei, neste mesmo aeroporto, quando um missionário, já nos seus longos e derradeiros anos de vida, voltando de Portugal, onde fora despedir-se dos seus familiares, amigos e espaços geográficos, enfrentou a multidão com um sorriso de uma ampla e tocante felicidade, porque escolhera Timor-Leste como terra de partida para a eternidade.
E dançou-se, e rezou-se, e
abraçou-se, transformando-se o aeroporto num templo de alegria.
Díli, 18 de outubro de 2025
[Continua]
