Em tempos de comemorar o 1º centenário da proclamação da República, é tempo de recordar algumas das figuras mais proeminentes de Paredes de Coura. De todas elas, destaco, pela sua importância pessoal, política e cultural a figura do Dr. Narciso Alves da Cunha.
Tendo vivido 62 anos, Narciso Alves da Cunha, e dada a sua amizade com o político e semi-courense Bernardino Machado, nome cimeiro dos primeiros tempos da República, teve uma influência ímpar na política regional, sobretudo depois de ter sido eleito deputado e senador, cujos cargos exerceu entre 1911 e 1913.
Apesar de ter sido membro do Partido Regenerador até Outubro de 1910, a República não o diminuiu politicamente, pois a sua formação humana rapidamente o colocou como membro do Partido Republicano, em estreita amizade com João Chagas e Afonso Costa, entre outros, não sendo possível esquecer o nome de Bernardino Machado, que começava a desempenhar os principais cargos da Nação.
Tendo-se mantido fiel ao Partido Regenerador até ao fim da monarquia, há uma polémica muito interessante com o António Mota, deputado e responsável em Valença e Paredes de Coura pela ala conservadora saída do Partido Regenerador, chefiada por Campos Henriques. Nessa mesma altura, Narciso Alves da Cunha apoiava Teixeira de Sousa, amigo pessoal de Bernardino Machado e de Afonso Costa, e nomeado líder do Partido Regenerado em Dezembro de 1909, bem como último chefe de um governo monárquico. É neste contexto que deve ser analisada a seguinte carta, envida pelo Drº. Narciso ao Drº António Mota, deputado nacional, natural de Valença, e dirigida para o Hotel Europa, Lisboa, em 26 de Janeiro de 1909.
“Meu caro Dr. Mota:
São sete horas da noite e acabo de receber o seu telegrama de hoje, no qual diz “que se considera incomodado dos seus encargos enquanto não reaver voto de confiança em harmonia com a nossa entrevista de finais de Dezembro”.
Em finais de Dezembro, para cumprir um dever de amizade e delicadeza, procurei o meu caro Dr. em sua casa para o cumprimentar, pois que da última vez que eu tinha estado em Valença, já o quisera fazer, chegando a indagar se estava ou não em sua casa, mas não me foi possível, por falta de tempo. Se a isto, à visita que eu fiz, em finais de Dezembro, chama entrevista, concordo com o termo empregado.
A verdade é que, por essa ocasião, abordado o assunto do Campos Henriques eu disse ao meu bom amigo que nós (os de Coura) nada tínhamos deliberado sobre o assunto. Disse-lhe a verdade e só a verdade.
Depois o Dr. Mota fez as suas apreciações quanto ao facto de Vilhena ter ou não tacto e qualidades para dirigir o partido. Concordei consigo neste ponto.
Depois falou-me de favores e finezas que devia ao Pimentel Pinto; depois leu-me e apreciou uma carta do Dr. Arturr ; depois falou-me de favores que devia ao Campos Henriques, dos embaraços em que tal estado de causas o colocava, e por último, que ficaria independente.
Prometi-lhe alguma coisa? Tomámos alguma deliberação, concertada entre ambos? O meu bom amigo saiu do partido regenerador?
Se saiu, não pode ter a confiança política do partido que foi de Miguel Dantas: se não saiu encontra-me e encontra todo o partido regenerador de Coura onde estávamos. E pergunto se saiu porque aqui corre, á boca cheia, que o Dr. Mota passou para o Campos Henriques; e tem-se estranhado, a ser isso verdade, como parece, não ter dito, claramente, a sua resolução.
Se, pois, se mantém fiel ao partido regenerador, o voto de confiança, de que fala, não se fará esperar. Se, porém, está com o Campos Henriques, nada me importa que leve consigo todos os partidários deste concelho, que o foram de Miguel Dantas, menos a mim.
Quem não pode representar, numa assembleia geral do seu partido, o eleitorado com quem tem ajudado a fazer deputados, também não pode continuar a prestar iguais serviços a quem faz afirmações daquela natureza.
Pão, pão, queijo, queijo. Continuo na minha teima: não estou resolvido a serviçal de cão mudo ao Snrº. Campos Henriques. Não estou e não serei.
Podia dizer tudo isto em duas palavras. Entendi, porém, que devia ao meu caro Dr. Mota esta definição de situações: eu onde sempre tenho estado, os outros onde quiserem.
Com o maior prazer recebo as suas ordens e assino-me
Seu afectuoso amigo, e com muito obrigado. Coura, 26-1-909 Narcizo”
dezembro 18, 2010
Subsídios históricos (Paredes de Coura)
dezembro 05, 2010
Que nada se sabe...
Que nada se sabe!
Esta frase pode significar muita coisa, mas é o título de um livro, escrito entre os séculos XVI e XVII, por Francisco Sanches.
Tendo sido denominado um precursor de Descartes, o filósofo da dúvida metódica, o bracarense Francisco Sanches não quis dizer que nada sabemos sobre o mundo ou sobre as coisas, apenas que o conhecimento dos homens não pode ser superior ao conhecimento, inacessível, de Deus.
Colocando de lado as questões mais ligadas ao conhecimento, e entrando no espaço político, parece que nada sabemos sobre o nosso futuro como país.
Paira sobre os portugueses um certo nervosismo e uma justa desconfiança relativamente aos políticos que nos têm governado nas últimas décadas.
Nada sabemos sobre o que nos espera nos próximos anos e décadas.
No entanto, adivinha-se que a maioria dos portugueses será confrontada com muitas dificuldades, enquanto, alguns, uma minoria que tem crescido enormemente, têm um paraíso dourado à sua frente. São os tais das mais-valias financeiras e os que politicamente dão sentido à célebre frase do António Guterres: the jobs for the boys (“os empregos para os rapazes” – amigos do poder, obviamente).
Sobre a crise económica nada sabemos. No passado, nada nos disseram de verdadeiro, já que nos enrodilharam em promessas e mais promessas que jamais dariam resultados. Promessa vinda da esquerda, por vezes cega quanto às efectivas possibilidades de mudar, e promessa oriunda da direita, quase sempre eufórica sobre as facilidades imediatas da mudança.
O mundo político parece que nada sabe sobre a vida dos portugueses. Apenas sabe que é um povo contribuinte, pagante ou não pagante de impostos, dependendo dos mais honestos e dos mais espertinhos, e sobre quem se poderá sempre aumentar o peso do dia-a-dia, mesmo que isso signifique despedimentos, redução de salários (para sempre, diz-se!), subida de impostos, levantamento de barreiras na educação e na saúde, enfim, o anúncio que o Estado-social vai enfraquecendo, qual moribundo que corre para a sua própria cova.
Sendo já enorme a crise, porque Portugal sempre teve a tendência doentia para se endividar no estrangeiro, ficando nas mãos dos investidores financeiros, as tais figuras invisíveis que constituem o mercado, nada se sabe sobre o que ainda falta acontecer nos próximos tempos.
Vamos cair nas garras do poder do Fundo Monetário Internacional? Vamos pedir para a porta da União Europeia?
Não, não vamos! Sim, vamos!; Possivelmente, vamos, como aconteceu aos gregos e aos irlandeses!. Obrigatoriamente, vamos, para que os espanhóis e, mais tarde os italianos, não entrem em crise.
Apesar de nada se saber sobre o dia de amanhã, muitos jovens portugueses já sabem que o seu futuro não passa por este país, mesmo estando mais habilitados a responder a novos desafios.
E um país que expulsa os seus jovens mais qualificados, como no passado expulsou os seus adultos menos qualificados, nada sabe sobre si mesmo.
Que realmente se pode saber sobre nós portugueses?
Esta frase pode significar muita coisa, mas é o título de um livro, escrito entre os séculos XVI e XVII, por Francisco Sanches.
Tendo sido denominado um precursor de Descartes, o filósofo da dúvida metódica, o bracarense Francisco Sanches não quis dizer que nada sabemos sobre o mundo ou sobre as coisas, apenas que o conhecimento dos homens não pode ser superior ao conhecimento, inacessível, de Deus.
Colocando de lado as questões mais ligadas ao conhecimento, e entrando no espaço político, parece que nada sabemos sobre o nosso futuro como país.
Paira sobre os portugueses um certo nervosismo e uma justa desconfiança relativamente aos políticos que nos têm governado nas últimas décadas.
Nada sabemos sobre o que nos espera nos próximos anos e décadas.
No entanto, adivinha-se que a maioria dos portugueses será confrontada com muitas dificuldades, enquanto, alguns, uma minoria que tem crescido enormemente, têm um paraíso dourado à sua frente. São os tais das mais-valias financeiras e os que politicamente dão sentido à célebre frase do António Guterres: the jobs for the boys (“os empregos para os rapazes” – amigos do poder, obviamente).
Sobre a crise económica nada sabemos. No passado, nada nos disseram de verdadeiro, já que nos enrodilharam em promessas e mais promessas que jamais dariam resultados. Promessa vinda da esquerda, por vezes cega quanto às efectivas possibilidades de mudar, e promessa oriunda da direita, quase sempre eufórica sobre as facilidades imediatas da mudança.
O mundo político parece que nada sabe sobre a vida dos portugueses. Apenas sabe que é um povo contribuinte, pagante ou não pagante de impostos, dependendo dos mais honestos e dos mais espertinhos, e sobre quem se poderá sempre aumentar o peso do dia-a-dia, mesmo que isso signifique despedimentos, redução de salários (para sempre, diz-se!), subida de impostos, levantamento de barreiras na educação e na saúde, enfim, o anúncio que o Estado-social vai enfraquecendo, qual moribundo que corre para a sua própria cova.
Sendo já enorme a crise, porque Portugal sempre teve a tendência doentia para se endividar no estrangeiro, ficando nas mãos dos investidores financeiros, as tais figuras invisíveis que constituem o mercado, nada se sabe sobre o que ainda falta acontecer nos próximos tempos.
Vamos cair nas garras do poder do Fundo Monetário Internacional? Vamos pedir para a porta da União Europeia?
Não, não vamos! Sim, vamos!; Possivelmente, vamos, como aconteceu aos gregos e aos irlandeses!. Obrigatoriamente, vamos, para que os espanhóis e, mais tarde os italianos, não entrem em crise.
Apesar de nada se saber sobre o dia de amanhã, muitos jovens portugueses já sabem que o seu futuro não passa por este país, mesmo estando mais habilitados a responder a novos desafios.
E um país que expulsa os seus jovens mais qualificados, como no passado expulsou os seus adultos menos qualificados, nada sabe sobre si mesmo.
Que realmente se pode saber sobre nós portugueses?
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